Relação lógico-cientifica entre Massa Muscular e Sarcopénia por Nelson Lima
À medida que envelhecemos procuramos naturalmente fazê-lo com saúde. Assim, parece-me lógico procurarmos um estilo de vida cada vez mais saudável, uma metodologia de exercício segura e eficaz, os alimentos mais salutares, assim como os hábitos a adquirir para se ter mais saúde e se ser mais forte.
A saúde é, sem dúvida, o verdadeiro tesouro que todos procuramos alcançar com longevidade no decurso da nossa vida. Considera-se «saúde» um estado fisiológico de ausência de doença ou patologias no qual que é mantido o equilíbrio biológico necessário entre os estados catabólico e anabólico.
A faculdade do corpo humano de manter esse equilíbrio entre o estado catabólico e anabólico é visível na sua capacidade em fazer ajustes adaptativos, permitindo a sobrevivência. A capacidade que o nosso corpo tem para resistir, readaptar e recuperar constantemente e com sucesso a um sem-número de ag entes agressores é considerada uma boa condição neuro-musculo-articular.
“… A evidência demonstra que a pessoa sedentária a partir dos 40 anos de idade perde sensivelmente 8% a 10% de massa muscular a cada 10 anos …”
A evidência demonstra que as pessoas sedentárias perdem, a partir dos 40 anos de idade, sensivelmente 8% a 10% de massa muscular a cada 10 anos. Esta perda é mais acentuada a partir dos 70 anos e também em mulheres em idade da menopausa, devido à falta de estrogénios, que têm um papel estimulador na regeneração da massa muscular.
Na sociedade moderna, o aumento gradual da automatização, os avanços na medicina e o fácil acesso à comida têm contribuído de uma forma decisiva para que as pessoas fomentem um estilo de vida cada vez mais sedentário, resultando numa inatividade neuromuscular prolongada e, consequentemente, na perda de força e de massa muscular. Este fato é tempo-dependente e, com o avançar da idade, dará origem a uma síndrome chamada Sarcopénia.
“…A Sarcopénia é uma síndrome que se caracteriza por perda gradual e generalizada da massa muscular esquelética e consequentemente perda de força…”
A Sarcopénia é uma síndrome que se caracteriza pela perda gradual e generalizada de massa muscular esquelética e consequente perda de força. Vários fatores contribuem para esta síndrome entre eles o processo de envelhecimento, a alimentação desadequada, o sedentarismo, doenças crónicas e determinados tratamentos farmacológicos. Está associada à deterioração do estado de saúde, à diminuição da mobilidade, a um maior risco de quedas e de fraturas, e à diminuição da condição física. Tudo isto ir-se-á refletir numa maior dificuldade em realizar as tarefas quotidianas, numa perda da independência e associar-se ao maior risco de contrair doenças crónicas (hipertensão, problemas cardíacos e pulmonares, diabetes, osteoartrite, cancro e osteoporose), assim como ao aumento do risco de morte. Estas patologias estão diretamente relacionadas com a perda de massa muscular/força. No gráfico abaixo vemos representada a curva da perda de massa muscular associada à idade e ao estilo de vida. À área que existe entre a massa/força muscular mínima e a capacidade atual de cada pessoa chamaremos de MARGEM FISIOLÓGICA.
Se entendermos a margem fisiológica como a diferença entre o mínimo e o máximo de massa muscular que uma pessoa pode ter, podemos observar que as pessoas que realizam treino de força mantêm maior longevidade de área de massa muscular, assim como mais saúde e qualidade de vida, comparativamente a pessoas sedentárias. Se observarmos a curva da linha vermelha verificamos que o declínio da massa muscular em pessoas débeis, com patologias e doenças crónicas, apresenta uma queda muito mais acentuada.
O tecido muscular é um órgão que só sabe contrair e é o único tecido biológico do sistema motor que o faz; é o principal mobilizador e protetor do sistema articular e o nosso maior órgão endócrino e imunológico; deve ser visto como principal Catalisador de Adaptações Neuro-Musculo-Articulares.
O tecido muscular é metabolicamente dispendioso para o corpo. Como tal, deveremos dar motivos ao nosso corpo para que o considere importante e receber estímulos que permitam mantê-lo para que este não entre num processo de degeneração.
Fig.2 O efeito da idade e relação com as unidades motoras e fibras musculares em jovens, no envelhecimento e com sarcopénia. Source: Lang, et al. (2010), Osteoporos Int. “Sarcopenia: etiology, clinical consequences, intervention and assessment.
Na figura acima podemos constatar que a Unidade Motora (conjunto de motoneurónios e das fibras musculares que esses motoneurónios inervam) de um músculo de um jovem (A) consegue inervar mais fibras rápidas. Com o envelhecimento e sedentarismo (B) vai-se perdendo inervação de fibras rápidas, que numa síndrome de sarcopénia são já praticamente inexistentes (C). A Sarcopénia afeta principalmente as denominadas fibras rápidas (tipo II). Estas são as que produzem mais força e consequentemente as mais propensas a atrofiar e a desaparecer com a falta de estimulação muscular. “Mesmo sendo mudanças subtis, a configuração das fibras musculares altera-se com a idade, existindo um decréscimo do número e tamanho das fibras tipo II” (Levangie e Norkin, 2005).
“…A Sarcopénia afecta principalmente as denominadas fibras rápidas (tipo II), são as que produzem mais força e consequentemente mais propensa a atrofiar e a desaparecer com a falta de estimulação muscular…”
A perda deste tipo de fibras musculares vem associada a uma diminuição de certas hormonas e fatores de crescimento como a Testosterona, a IGF-1 (denominada a hormona de crescimento) e ao incremento de citoquinas inflamatórias como a TNFFalfa e Leucina-6, que incrementam a inflamação do nosso organismo e degeneração tecidular. Estes são considerados os principais fatores fisiológicos para a Sarcopénia, (Source: Lang, et al. 2010).
Para evitar a degeneração do músculo precisamos de uma estimulação muscular que promova a síntese proteica e a regeneração do tecido muscular. Desta forma, o recrutamento máximo do espectro de fibras musculares é determinante para a síntese proteica e tem como objetivo alcançar uma intensidade que permita alcançar a estimulação de fibras tipo II.
“… Atividades cíclicas ou recreativas como caminhar, correr, ciclismo, ou simplesmente pilates, yoga e alongamento não promovem os estímulos e consequentemente as adaptações fisiológicas apropriadas para promover a síntese proteica…”
Atividades cíclicas ou recreativas como a caminhada, a corrida, o ciclismo, ou outras como pilates, yoga e alongamento não promovem os estímulos e consequentes adaptações fisiológicas apropriadas para promover a síntese proteica.
Iremos considerar treino de força como sendo exercício realizado com resistência externa, que promove adaptações biológicas positivas, que vai de encontro às necessidades e objetivos neuro-musculo-articulares do praticante e cujos efeitos adaptativos, sobretudo de hipertrofia muscular, possam derivar, em grande medida, da contração muscular, o que potenciará efeitos subsequentes ao nível da síntese proteica.
Restaurar, desenvolver e conservar a condição física do corpo humano devem ser os principais objetivos a ter em conta na construção de exercícios para pessoas que os pretendam para melhorar a sua saúde.
O treino de força deverá ter características específicas para que seja efetivamente uma forma de exercício seguro, eficiente, eficaz, sustentável, autêntico, com elevado nível de qualidade profissional e com total respeito pelas idiossincrasias que determinado corpo possa apresentar.
Elaborarei um quadro com o resumo dos pontos-chave que considero relevantes e indispensáveis na construção e monitorização do exercício de força:
A evidência científica demonstra que o treino de força é vital na manutenção e crescimento da estrutura muscular, desde que seja adaptado à condição de cada pessoa. O treino de força é, na realidade, um potente coadjuvante na melhoria de adaptações neuro-musculo-articulares. Uma revisão de estudos realizada por (Fielding,1995) demonstrou que um programa de força de 8 semanas em homens com 70 anos, realizado a 40% de 1RM, foi suficiente para melhorar a força em 66% nos flexores do cotovelo. Mostrou ainda que os exercícios de força aumentaram o arco da força muscular, tendo chegado à conclusão de que o treino com resistência é um método eficaz para prevenir a sarcopénia na terceira idade. A evidência deixa patente que, para este tipo de população, numa fase inicial do processo de treino, cargas mais leves promovem melhorias de força.
“ … O treino de força é na realidade um potente coadjuvante na melhoria de adaptações neuro-musculo-articulares, uma revisão de estudos realizado por (Fielding,1995) …”
Um outro autor (Frontera e al.1988) realizou um programa de treinos com homens de 64 anos, composto por dois exercícios específicos de extensão e flexão do joelho em máquinas guiadas. Este programa era realizado 3 vezes por semana a 80% de 1 RM, com intervalo de repetições entre as 8 a 10, durante 12 semanas. Os resultados, verificados através de biopsia, foram surpreendentes uma vez que o grupo que realizou o programa alcançou um aumento de 11% da secção transversal do músculo, 33% de aumento em fibras tipo I e 27% em fibras tipo II.
Pretendeu-se transmitir ao leitor uma perspetiva qualitativa na configuração, superar as dúvidas generalizadas acerca dos benefícios do treino de estimulação muscular, através do treino de força, e a sua importância na manutenção e otimização da massa muscular. A evidência científica é perentória em afirmar que o treino de força é o método de treino mais eficaz e preventivo da sarcopénia bem como um poderoso coadjuvante na prevenção de doenças crónicas.